O Levante do Gueto de Varsóvia e o Levante de Varsóvia – Polônia

Nada de muito novo ocorreu depois que voltei, pela terceira vez, para Varsóvia. Reencontro com os velhos amigos, mais algumas idas ao café do Toni e algumas andanças pela cidade.
Acabei indo também ao fantástico museu do Levante de Varsóvia, um dos mais bem equipados e interessantes museus que pude comparecer em toda a minha viagem. Tema que escreverei neste post porque acho que é uma história que nunca deve ser esquecida.

O que foi o Levante de Varsóvia? Bem, durante a Segunda Guerra Mundial, a Polônia acabou sendo atacada pelos dois lados e foi esmagada pelas duas maiores potências militares da época: A União Soviética e a Alemanha Nazista. É daí que vem a expressão “corredor polonês” que consiste em uma pessoa indefesa ter que sair correndo entre duas filas, recebendo ataque dos dois lados e levando porrada pra todo lado. Os poloneses na Segunda Guerra Mundial meio que se sentiram assim durante a invasão dos dois maiores exércitos assassinos da história, os nazistas e os stalinistas. O final já era esperado, em menos de três semanas o mundo estupefato assistia ao desaparecimento de um dos maiores países da Europa. Eu falo assim a galera parece que não se liga direito do que é você tomar um país do tamanho de São Paulo em apenas três semanas, mas só a título de comparação, os EUA levaram quase seis meses pra expulsar as tropas de Saddam Hussein do Kuwait durante a guerra do Golfo. Isso porque eles tinham uma coalização de 29 países (entre eles Inglaterra, França…) por detrás. SEIS MESES pra tomar de volta um país que se duvidar é menor do que o Estado de Alagoas.

Após esse verdadeiro massacre sofrido pelas tropas polonesas, os nazistas amontoaram judeus poloneses em guetos. Amontoar é mesmo o nome certo, já que quase 400.000 judeus poloneses foram transferidos pra um bairro da cidade de Varsóvia para morrerem lentamente de fome, frio e doenças. Mais uma vez, só para ilustrar, 30% da população foi transferida pra menos de 2,4% do território da cidade de Varsóvia. A ração a que cada judeu tinha direito dentro do gueto supria menos de 200 kcal diárias o que é menos do que 10% do necessário para o corpo humano se manter vivo. Para evitar fugas, os alemães ergueram verdadeiras muralhas ao redor do gueto, colocaram arame farpado e ostensiva vigilância o que tornava quase impossível escapar do gueto.

Judeus tentando escapar do gueto
Desesperados, os judeus iam morrendo lentamente, mas sem nunca a população do gueto diminuir de forma drástica, já que judeus de todas as partes da Europa eram trazidos para o gueto o que sempre o tornava super-lotado.

Depois de algum tempo morrendo como moscas eles perceberam que não teriam chances e que mais cedo ou mais tarde a morte seria o fim de todas as pessoas que estavam dentro daquele inferno. Então, já que iriam morrer mesmo eles pensaram: – Bem, até que não seria uma má ideia se ao invés de morrermos de fome, nós levássemos uns alemães com a gente. E dessa maneira, armados de tudo que eles poderiam carregar os judeus decidiram sair no pau no melhor estilo “o que é um peido pra quem já tá cagado? Bem, o resultado vocês podem imaginar o que foi, né? Imagine você armado com escorredor de macarrão, panela de barro e umas colheres de madeira lutando contra soldados com coletes a prova de bala e armas automáticas? O fim não deveria ser outro. Do lado dos alemães eles perderam menos de 50 soldados contra mais de 50.000 judeus que foram mortos ou transferidos pra campos de concentração. Bem, se você olhar pelo lado dos números, parece que não adiantou de nada, mas deixando a frieza da matemática de lado, imagine o simbolismo que o levante teve para os poloneses e para os judeus que pelo menos morreram lutando. Além disso, houve a tremenda dor de cabeça para os alemães de ter que retirar tropas do front para poder conter a revolta e, o mais importante, o aumento da moral dos poloneses e dos judeus em geral após isso.

Castelo Real Polonês. Foi totalmente destruído após a Segunda Guerra Mundial e levou mais de vinte anos para ser reconstruído
Após a revolta do Gueto de Varsóvia, foi a vez dos poloneses realizarem um ainda mais brutal. Sabendo que o fim da guerra estava próximo e que as tropas russas estavam a alguns quilômetros das possessões da cidade, a resistência polonesa se empolgou e viu que aquela era a hora para poder dar o troco nos alemães. Mal-armados, mas com a moral elevada e esperando contar com o apoio do Exército Vermelho, os poloneses saíram metendo bala nos alemães que, apesar de bem armados, já se encontravam com a moral abalada.
Interior do museu
Os alemães viram o inferno nascer do dia para a noite. Sem entender o que estava acontecendo e acostumados com a calmaria de apenas patrulhar uma cidade dominada e longe do front de guerra, os alemães se viram no meio de uma cilada. Homens, mulheres, velhos surgiam de todos os lados e de todos os buracos armados com submetralhadoras, granadas e o que mais haviam conseguido contrabandear. Os poloneses metiam bala do jeito que dava nos alemães como quem diziam: – Tá ruim agora? Espera só os nossos amigos soviéticos chegarem pra vocês verem o que é o pau comendo. E assim foi durante alguns dias enquanto cada vez mais as tropas soviéticas se aproximavam da cidade.
Placas com nomes de pessoas mortas durante o Levante
Até que a meros 10 quilômetros de Varsóvia, o Exército Vermelho simplesmente parou! Parou de marchar e ficou assistindo a desesperada revolta polonesa. Ninguém entendeu nada. Eles simplesmente pararam e não avançaram mais nenhum passo. Os poloneses se desesperaram. Percebendo que os soviéticos pareciam que não interviriam no levante, os alemães saíram da defensiva e desceram o cacete nos poloneses que não puderam fazer nada a não ser continuar sua desesperada guerrilha urbana contra os alemães. Como Direitos Humanos não eram lá a maior preocupação de Hitler, de Berlim veio a ordem de demolir cada centímetro de Varsóvia. Casa por casa, engenheiros alemães iam demolindo e tacando fogo com lança-chamas. Nos planos de Hitler, Varsóvia deveria simplesmente desaparecer, ornando-se apenas um entreposto militar ou, quem sabe, um lago.
Esta imagem aqui não tem nada a ver com a história não. Só coloquei uma foto dos Lençóis
Maranhenses pra galera relaxar um pouco e sair desse tema de “Guerra, guerra, guerra” 🙂
Estima-se que 85% da cidade viraram escombros, com especial atenção à destruição de monumentos históricos e de grande simbolismo para os poloneses, como tumbas de grandes heróis nacionais, o Parlamento Polonês, sua Biblioteca Nacional, seu Museu Nacional entre outros. Em 1945 não havia sequer uma ponte ainda de pé. Água corrente e eletricidade? Claro que não. Viver na cidade em 1945 era como viver em uma vila medieval na Alta Idade Média.
Depois que os alemães esmagaram a revolta e transformaram a cidade inteira em pó, o Exército Vermelho enfim marchou sobre Varsóvia e massacrou os alemães “libertando” assim a cidade. Só após alguns anos que se obteve conhecimento que a ordem para as tropas pararem de marchar e esperarem o fim do levante para só assim lutarem contra os alemães partiu diretamente de Stálin. Por quê? Bem, se o Exército Vermelho cooperasse com a revolta, eles teriam apenas um papel de coadjuvantes, algo como o papel que os americanos reservam aos franceses na sua luta da independência quando se não fossem pelos franceses, os EUA nunca teriam vencido a guerra contra os ingleses. Além de terem o papel de coadjuvantes, os poloneses sairiam mais fortes e dificilmente aceitariam ser um reles estado-satélite dos russos como foram de 1945 a 1991. Mesmo que os soviéticos quisessem impor um governo fantoche na Polônia eles teriam que enfrentar uma tropa polonesa bem armada e de moral elevada, esmagá-los e só assim colocar o fantoche que quisessem para governar a Polônia. Foi muito mais fácil deixar os alemães fazerem esse “serviço”. Fechou certinho: Os alemães mataram tudo o que havia de um remanescente exército polaco, os poloneses mataram uma pancada de alemães e pros russos sobrou só o serviço mais fácil que foi o de lutar contra os alemães que restaram e ainda saíram pagando de “libertadores” da Polônia.
Relógio que Stálin deu “de presente” para os poloneses após “libertar” os poloneses. Ele seria algo como uma “Estátua da Liberdade russa”. Logicamente é um dos monumentos mais odiados pelos poloneses em geral.
Bem, o final todo mundo já conhece. A Polônia ao invés de conquistar a sua tão sonhada liberdade, amargou durante mais de cinquenta anos um dos mais sanguinários regimes da história da humanidade, que foi o comunismo russo. Tanto é que se você perguntar pra qualquer polonês há quantos anos faz que a Polônia é independente, ele vai responder:
– Há 18 anos. Estamos independentes desde 1991.
Figura pintada numa das paredes do museu
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3 comentários em “O Levante do Gueto de Varsóvia e o Levante de Varsóvia – Polônia

  1. Aí sim Claudio!!!

    Um post das antigas. Cheio de história e cultura! Deu um gosto enorme lê-lo.

    Ainda que não tenha sido nenhuma novidade, afinal eu “gosto” da 2ª G.M., no sentido acadêmico da palavra.
    Mas valeu mesmo assim. Excelente post.

    Seria bom que muitos “stalinistas” e “maoístas” dessem uma revisada neste capítulo da humanidade para avaliar melhor suas posições ideológicas.

    Abração meu caro.

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  2. oi Claudiomar

    Que história triste e como você viu esses monumentos e museus de pertinho, deve ter ficado muito triste.
    Adoro ler seus posts, são super interessantes.

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