E o desânimo começa a nos vencer…

Assim que descemos no posto, começamos, loucamente, a tentar conseguir de qualquer maneira uma carona em direção à Praga. Estava começando a escurecer, o que nos preocupava cada mais pois, afinal, estávamos no começo do inverno europeu e a temperatura a noite facilmente chega nos dez, oito graus. Já era umas cinco da tarde e o friozão começou a surgir. Boto fé que devia estar por volta de uns quinze graus o que pode não ser tão frio assim, mas em um ambiente de vento contínuo, duas pessoas sem agasalhos e em exposição ao ambiente (uma vez que não ficávamos dentro da loja de conveniência pra poder pedir carona, mas sim do lado de fora esperando os carros pararem) podia fazer lá seus estragos. Começamos a ficar já sem esperanças, pois anoitecia e nada de conseguirmos um carro pra poder nos levar. Como parecia que nada ia sair dali, fomos a um hotel que pertencia ao posto e que era próximo de onde estávamos pra podermos checar se havia possibilidade de ficarmos hospedados lá por uma noite e pela manhã tentaríamos ter mais sorte. Diária? 100 Euros! É, parece que ou a gente conseguia uma carona ou íamos dormir na rua mesmo.

Voltamos para as bombas de gasolina e continuamos implorando (sim, o verbo certo era implorar mesmo! Nessa hora a ideia de viajar de carona não parecia mais tão divertida assim) para que alguém nos levasse. Até que um carro com uma mãe e sua filha adolescente parou para abastecer e Gosia perguntou se tinha como elas nos darem uma carona, nem que fosse pra cidade mais próxima para ficarmos em um albergue. A mulher não falava inglês, mas conseguimos nos comunicar com a sua filha. Explicamos nossa situação e sua mãe falou que tinha uma ideia melhor. Ela iria nos levar a outro posto de gasolina já que aquele que estávamos, segundo ela, era muito ruim pra pegar carona, pois o fluxo de caminhões era muito baixo e o posto era meio que um desvio da rodovia. Ela nos disse que iria nos levar a um outro posto, esse sim na rodovia, que lá era melhor para tentar conseguir algo. Entramos no carro e seguimos adiante. Uns quinze minutos depois elas nos deixaram lá e, não obstante, a mãe nos deu o celular dela dizendo que era pra ligarmos pra ela caso não conseguíssemos carona alguma. Pra que iríamos ligar? Bem, ela disse que se não conseguíssemos sair dali, ela iria nos buscar no posto, nos levar pra casa dela para lá passarmos uma noite e no outro dia de manhã poderíamos tentar a sorte. Resumindo, a mulher era UM ANJO!! Ela não só nos deu uma força, como se dispôs a recolher dois transeuntes no meio da rua e levar pra dentro da casa dela. Quase um amigo do Eion de saias (leia a história aqui). Perguntamos porque ela estava sendo tão gentil com a gente (cara, confesso seriamente que fiquei com medo dela levar meus rins) e ela explicou que cresceu na Alemanha Oriental e viajar de carona era a única maneira que ela tinha como viajar nos tempos da Cortina de Ferro. Devido a isso, sempre costumava ajudar mochileiros perdidos pela Alemanha.
 Casa do Snoop

Elas nos deixaram no outro posto e seguiram viagem. Umas palavras de conforto e um encontro agradável como aquele que acabávamos de ter era tudo o que precisávamos para poder aumentar a moral da tropa. Ninguém dá carona pra quem chega com um semblante triste na face. Após descer do carro dela, eu e Gosia fomos na febre em cima dos motoristas pra ver se conseguíamos sair logo dali. Mas cara, foi rápido dessa vez. A tiazona realmente tinha razão. Gosia abordou um caminhoneiro, falando em inglês, e ele fez uma cara de que não entendia patavinas do que ela falava. Ele meio que falou gesticulou que não falava inglês. Nós meio que perguntamos de que país ele era e ele meio que respondeu que era da Polônia. Felicidade geral! O cara era polaco!!

Gosia se empolgou e começou a falar com ele em polaco e perguntou se o cara poderia dar uma carona pra gente pra Praga. Ele ficou meio que chateado e falou que não era possível, já que, olha só, ele estava indo direto pra Varsóvia!! AAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHHHHHH!!! Não brinca, amigo!! Falamos pra ele que na verdade queríamos mesmo era ir pra Varsóvia, que Praga apenas estava no caminho. Ele falou que tudo bem e nos enfiou dentro do caminhão dele! Felicidade nível 5!!
O cara parecia ser gente boa, mas não falava inglês. Gosia meio que conversava um pouco com ele e depois conversava comigo. Ele vendo que eu tava meio entediado, perguntou se eu não queria beber algo e VLAPT! puxou uma gaveta de baixo do meu assento. O que surgiu?? Dezenas, MUITAS latas de cerveja geladas!! O cara tinha uma gaveta refrigerada dentro da boleia do caminhão dele!!! Algo como uma mini geladeira! Gosia falou que não queria beber. O cara falou que não tinha problema e VLAPT! puxou outra gaveta e de lá tirou um queijo francês. Eu comecei a ficar impressionado com o tanto de coisa que tinha naquela boleia, cara! Parecia até a casa de cachorro do Snoop (pra quem não lembra do desenho animado. A casa do Snoop por fora parecia minúscula, mas quando ele entrava a casa o interior da casa era gigantesco! Parecia uma mansão! Coisa de desenho animado)! Eu perguntei pra ele se ele tinha mais alguma uma surpresa escondida por lá e o bicho VLAPT! puxou uma cortina que estava atrás dos nossos bancos. O que surgiu? Uma grade de cerveja? Não!! Uma BELICHE!! O cara tinha uma BELICHE dentro da boleia do caminhão dele!! Pô depois de uma beliche o que eu comecei a procurar? Lógico! Perguntei pra ele se ele teria dentro do caminhão um chuveiro quente pra eu tomar um banho. E só servia se fosse quente! Gosia traduziu e ele falou que infelizmente não tinha, mas se eu quisesse outra cerveja, não havia problema!
Gosia segurando uma das latinhas de cerveja que ele nos deu
(repare que a latinha é  de uns 500 ml) e o caminhoneiro segurando a sua gavetinha refrigerada mágica!
Fomos conversando e viajando até que eu e Gosia resolvemos pedir pra ele nos deixar em Wroclaw, cidade polonesa no caminho que já havíamos sido hospedados. Po, dormir numa boleia de caminhão não parecia ser uma coisa muito agradável. Ele falou que tudo bem e nos largou por la. Ligamos pro couchsurfer que havia nos hospedado antes e ele falou que poderia nos hospedar mais uma noite sem problema. Dormimos por lá e no outro dia pegamos carona pra Varsóvia com um tiozão num carro bem rápido.
Chegávamos a Varsóvia, acabando por vez minhas viagens e estripulias com Gosia. Era hora de se preparar pra poder continuar caminho e viajar para Istambul na Turquia.

Saindo de Munique…

Pela manhã acordamos e fomos dar um rolê por Munique. Nada de muito importante a não ser a visita à sede da BMW. O que rolou de mais louco quando estive nessa cidade foi que a segunda feira que eu estive em Munique foi a famosa “Segunda-Feira negra”. Eu sei que isso já faz mais de um ano e que nosso país acabou, graças a Deus, saindo bem dessa crise (nunca antes na história desse país…). Pra quem não lembra, a “Segunda-Feira negra” ocorreu quando o Banco Lehman Brothers decretou falência e desencadeou, assim, a crise mundial do ano passado.

Pra maioria da galera que tava na vida do “vou pro trabalho, volta pra casa e durmo” no Brasil, recebendo em real e gastando em real, a crise não foi muito sentida, uma vez que, como falei, o nosso país sofreu pouco com a crise. Por outro lado, pra mim que estava no exterior, olhar aqueles jornais com cenas catastróficas de bolsas mundiais despencando e desespero por toda a parte foi uma cena aterradora. Primeiro porque estava tudo em alemão e não dava pra entender PATAVINAS do que estava escrito e segundo, bem, segundo porque a minha grana em dólar já tava acabando e o pouco que eu tinha estava em reais e eu sabia que, uma hora ou outra, eu iria precisar pedir ajuda pro meu pai pra terminar a viagem e ele iria (assim como me ajudou) também com reais. Em menos de um mês eu vi o real se desvalorizar quase 0,70 centavos em relação ao dólar e a outras moedas como o Euro. Era realmente desesperador abrir o site da Folha e ver que o dólar tinha fechado o dia com valorização de cinco, sete por cento em UM DIA. Houve um dia, que ainda está bem claro na minha mente, que eu abri o site e vi o euro se valorizando quase DOZE por cento em um dia em relação ao real!!! Aquilo realmente foi desesperador e foi um dos motivos em eu adiantar a minha volta ao Brasil em quase um mês. Minha grana simplesmente virou farelo!!!

Depois de passearmos pela cidade, eu e Gosia fomos para a casa do Chris, amigo do Eion que falou que iria nos hospedar.
Preparei um arroz para comermos, conversamos um pouco com aquele cara meio doido (pombas, ele praticamente recolheu dois malucos pra dentro de casa e levou pra dormir) e fomos dormir. O figura foi gente boa demais! No outro dia acordamos cedo e saímos pra poder conseguir uma carona de volta pra Varsóvia.
Tentando volta a Varsóvia
Cara, que parto foi pra poder conseguirmos sair de Munique!! A cidade era GIGANTESCA e tava extremamente difícil achar a saída dela. Descemos em um ponto de ônibus e ficamos perdidos tentando achar onde deveríamos pegar a carona sabendo que bastava apenas virar uma esquina e achar a rua certa. De repente, uma simpática senhora alemã se aproximou da gente com um inglês muito engraçadinho (Excuseeee me!! Do you want some heeeelllppp??) e nos indicou o local. Agradecemos a ela e saímos no sentido indicado e, pimba, estávamos na saída da cidade. Ficamos um bom tempo tentando conseguir uma carona, mas realmente tava muito difícil lá.
Caminho que deveríamos seguir até Praga
Depois de mais ou menos uma ou duas horas, conseguimos uma carona, mas só pra 30 quilômetros depois. Bom, vamos lá, pelo menos sair da cidade e ficar em um posto no meio da autoestrada facilitaria e muito a nossa vida. Chegamos no posto, compramos alguma coisa pra comer e ficamos pedindo carona pra cada um que entrava na loja de conveniência pra ver se alguém se sensibilizava e nos colocava pra dentro. Uma hora depois, nada de conseguirmos. Resolvemos mudar de estratégia e ficamos na saída do posto fazendo sinal de carona pra todos os carros/caminhões/bicicletas que saíam. Depois de uns quinze minutos um carro veio parando. Ôpa!! Uma carona.
Engraçado, o carro era meio diferente dos que estávamos acostumados a ver. Ele era azul, tinha uns detalhes em branco do lado… Eita porra!! POLÍCIA!! Era a polícia!! E tava vindo na nossa direção!! A polícia veio vindo e eu fui só pensando: – Bem, não era exatamente esse tipo de carona que eu esperava. Tá certo que cadeia é casa e comida de graça, mas não era muito o tipo de carona que eu esperava… O carro veio vindo, vindo e nós tentando aparentar tranquilidade fazendo que não era com a gente. Ele parou do nosso lado. Sim, era com a gente!! Eu pensei: – Pronto! Tou preso!! Nesse país facista do caralho tudo deve ser proibido! Deve ser proibido pegar carona também!!!”. Ficamos esperando o que ia rolar quando o vidrinho do carro foi baixando e o simpático guardinha foi falar comigo:
DOCUMENTO!!
Sim, não foi “Bom dia” não foi “Oi, tudo bom?” nada disso. O bicho só deu um grito no melhor estilo “DOCUMENTO, PORRA!!”. Dei meu passaporte, ele me fez algumas perguntas e depois nos deixou ir embora. Não tinha nada de errado, portanto ele não poderia fazer nada (não que ele não quisesse).
Depois dessa singela abordagem policial, continuamos na saída do posto, tremendo mais que trator em ponto morto devido o frio que dóia nos nossos ossos. Depois de mais ou menos uma hora, um simpático senhor parou seu caminhãozinho e nos ofereceu carona. Gosia enrolou um alemão lá com ele e ele falou que não iria para o nosso caminho, mas que só poderia nos deixar uns 70 quilômetros a frente em um posto um pouquinho mais movimentado. O dia realmente tava rendendo, em quase seis horas tínhamos conseguido viajar por volta de uns cem quilômetros. Só pra vocês utilizarem como base, se tivéssemos ido a pé teríamos percorrido quase a metade disso.

TECLA Pause
Esse é um dos grandes problemas de viajar de carona. A gente tem até aquela imagem romântica, você em pé do lado da auto-estrada com os ventos batendo nos seus cabelos, viajando pra onde o vento lhe levar. Sem gastar nada, sem se preocupar com o tempo, apenas curtindo uma vida que teima em passar rápido demais. Quase uma mistura de um filme de James Dean e Indiana Jones. Beleza, realmente é desse jeito, cara!! NO COMEÇO é desse jeito. No começo tudo é novidade, você fica ali em pé com o braço estendido e só curtindo a onda. Mas, sério, imagina você depois de duas horas segurando uma maldita placa, com um braço estendido no calor ou no frio, sem que ninguém pare pra poder te ajudar? Bem, você imaginou. Era exatamente assim que eu estava me sentido depois de seis horas, e apenas 100 quilômetros depois, implorando pra que as pessoas nos enfiassem dentro dos carros delas. Sério, depois de uma hora, pedir carona começa a encher o saco…

Senhor, me dá um carona, pelamordedeus…

TECLA Play
O tiozão era até gente boa. Ele foi nos guiando e explicando várias coisas no caminho. Dizia que nutria uma certa simpatia por Hitler quando ele assumiu o poder na Alemanha. Falou que ele tinha feito importates reformas no país, mas depois de um tempo ele começou a ficar louco e matar todo mundo, aí ele não tinha ficado mais tão legal assim. Nos deixou em um posto e continuamos tentando ver se conseguíamos pelo menos dormir em Praga, um terço do trajeto até Varsóvia, mas já ajudava em alguma coisa.

Munique

Subimos ao apartamento do Eion e fomos nos preparando pra poder achar o nosso lugarzinho para dormir. Como o Eion tinha acabado de chegar ao apartamento, ele ficou meio perdido de onde iria nos hospedar. Depois de um tempo ele decidiu que nos deixaria dormindo com ele no quarto. Pegou dois cobertores, colocou no chão e deu dois lençóis pra gente poder se cobrir. Largamos nossas mochilas lá e fomos tomar um banho (separados, gente, sempre bom frisar).
Depois de mais ou menos uns trinta minutos, fomos pra cozinha e eu comecei a preparar um jantarzão pra galera. Jantar é até uma bondade falar, pois quando a gente perguntou se o Eion podia conseguir algo pra gente comer, o bicho falou que não tinha nada na geladeira, pois, sempre bom frisar, ele tinha acabado de “se mudar” pra lá. Ah, cumpade, mas com a fome que a gente tava não tinha conversa, começamos a fuçar e garimpar a geladeira à procura de qualquer coisa que fosse possível ser usada para saciar nossa fome. Após uns dez minutos de picaretas e enxadas na mão, achamos uns mantimentos perdidos lá dentro: Dois dentes de alho, um pacote de macarrão no armário, umas folhas de alface e um potezinho com molho parmesão dentro. Não teve tempo ruim! Misturei tudo e fiz uma “macarronada bomba” (me lembrei de Wroclaw na hora) pra galera, sem problema algum.
E fomos nessa. Conversa daqui, conversa dali, come daqui. Ficamos mais a vontade. E bem, Claudiomarzinho à vontade em um ambiente desconhecido é quase que uma arma de destruição em massa. Comecei a rir e ALTO. Ah, meu amigo, acabamos esquecendo da casa em que estávamos e, lógico, isso virou um problema. Uns trinta minutos depois de termos começado a nossa “fanfarra” entra um dos alemães moradores da casa pra beber uma água e se assusta. Ele deu uma parada na porta da cozinha e nos olhou com aquela cara de “Quem são vocês? O que vocês fazem aqui na minha casa? Vocês pertencem a esta realidade?”. Ficou nos olhando algum tempo sem entender NADA do que estava acontecendo. Imagina, você tá em casa, deitado na cama do seu quarto, assistindo “Friends”, vai tomar uma água na cozinha e se depara com três estranhos QUE VOCÊ NUNCA VIU NA VIDA comendo na sua cozinha. É lógico que ele ficou chocado com a situação. O Eion quando viu isso, resolveu quebrar o gelo e se apresentou como o “novo morador da casa” e explicou a história dele. O cara não parece muito ter gostado da história, mas se preocupou mesmo foi em perguntar quem diabos era aquela polonesa e aquele brasileiro mala na cozinha deles. Nós contamos toda a história que havíamos inventado no caminho e ele fingiu que acreditou e nós fingimos que acreditamos que ele acreditou. No final a gente até convidou o figura a se sentar na mesa com a gente, pois estávamos conversando acerca de “algumas histórias da infância de Gosia e Eion” (sim, o nosso nível de cinismo estava realmente baixo, heheheh)
Quando terminamos de comer, o Eion lembrou de nos avisar que havia um problema. Ele só poderia nos hospedar naquela noite, pois na outra noite ele iria viajar e dormiria em casa, logo teríamos que sair (pô, ficar lá sem pelo menos um dos “pseudomoradores” também já era demais, né?). Eita porra e agora? O que fazer? Dormir na rua? Pagar 30 euros por um albergue? Ah, meu amigo, nada a é problema! Um amigo do Eion que havia chegado há uns 15 minutos e havia acabado de nos conhecer falou que poderia nos hospedar por mais uma noite na casa dele, que não havia problema algum. Problema resolvido, continuamos conversando e depois fomos dormir…
Engraçado como as coisas nas nossas vidas pareciam sempre se resolver nos últimos segundos…

Conseguindo um lugar para ficar em Munique

Outono em Munique

Pegamos nosso metrô em direção à estação que havia sido combinada anteriormente. Chegamos lá e ficamos esperando pelo nosso host que até aquele momento não conhecíamos nem o rosto.
Esperamos por volta de uns vinte minutos e novamente o celular de Gosia tocou. Era uma mensagem nos solicitando que fôssemos pra uma saída do metrô específica para o encontrarmos. Fomos para o local indicado e lá estava o figura, leve e solto, nos esperando no local combinado. O nome dele era Eoin e ele era um irlandês vivendo em Munique. Falou que trabalhava de guia turístico na cidade e estava lá por um tempo pra poder dar uma viajada.

…mochileiros desesperados de fome, passam em um supermercado e destroçam galinha no meio do metrô. Potencialmente perigosos…

Quando começamos a conversar, ele nos falou que era necessário que nós inventássemos uma história pra que ele pudesse nos levar para o apartamento dele. Por quê? Bem, segue a história:

– Cara, o grande problema é o seguinte! O apartamento que eu estou morando esses dias não é meu!!
– Uai, como assim? Você é um couchsurfer morando na casa de outra pessoa e ainda assim oferecendo o apartamento dele? (Vocês pensam que isso é estranho? Eu já conheci um cara que fazia isso, ahahahah)
– Er… basicamente sim…
– Como assim, brother?

– Cara, foi o seguinte. Um brother meu fechou um contrato pro ano inteiro do apartamento dele. Esses dias ele pegou férias no trabalho e decidiu que queria viajar. Como ele já tinha pago o aluguel, ele perguntou se eu não queria ficar morando no apê dele esse mês e assim eu não precisaria pagar aluguel na pensão que eu estava. Por isso que eu tou morando num apartamento que não é meu e pelo qual eu não paguei nenhum tostão de aluguel.
– Ah massa! E você além de não pagar aluguel, ainda hospeda a galera do couchsurfing, assim, na moral?
– É!!!
– Hauhauehuaeh… Beleza. E os caras que moram com esse seu amigo, o que eles acham disso? Eles aceitam de boa você trazer desconhecidos pra dormir no apartamento que ELES estão pagando?
– Ah, cara, não sei ainda.
– ÃHN??? Você não perguntou pra eles se a gente pode ficar lá?!?!?!?
– Er… Não cara, não foi isso. O problema é que eu ainda não vi nenhum deles, eu mudei pro apartamento HOJE!
Ser sexy não é uma questão de escolha. É uma questão de talento…

Sério, o cara era bem mais PIRADO do que eu imaginava!! Não é que ele era folgado ao ponto de levar dois malucos pra dormir na casa dele!! O cara chegou ao ponto de já NO PRIMEIRO DIA morando DE FAVOR levar dois mochileiros perdidos pra poder ficar no apartamento QUE NÃO É DELE. Mas de boa, gente, pensem que os alemães são famosos por ser pessoas bem flexíveis e extrovertidas (sim, eu tou sendo irônico!). Mas vamos lá, fomos indo pra casa dele e no caminho, conversando:



– Tá, blz. Você vai nos levar para o apartamento de alguns malucos que você NUNCA viu na vida e nos enfiar lá dentro, certo?

– Sim!!
– Mas tipo, você não acha que seria uma boa você PELO MENOS inventar uma história pra poder fazer isso? Tipo, dizer que nós somos amigos de longa data e viemos lhe visitar aqui em Munique? Assim, pra, pelo menos, os caras não ficarem achando que você fica “juntando” pessoas nas ruas e levando pra dentro de casa?
– Humm… Sabe que é uma boa idéia?

Fala aí, ficou igualzinho eu imitando a estátua, não?
– Então, pensa numa boa desculpa aí que você poderia dar
– A gente poderia falar que se conheceu quando estávamos escalando o Everest, que tal? |Você acha que vai colar? (Bicho, juro POR DEUS que ele falou isso!!! Não tou mentindo!!!)
– Essa é a sua melhor desculpa?
– Cara, acho que sim…
– Você não é muito certo, né?
– Nem um pouco…
– Cara, eu nunca escalei o Everest, algo me diz que essa não vai colar. Ok… Vamos pensar numa história diferente. De onde tu és, cara, mal que eu te pergunte?
– Irlanda!! (Tinha que ser!! Deve ter bebido uísque a rodo pra ficar assim, ahahhah)
– Pronto!! Vamos inventar uma desculpa assim. Todo mundo sabe que a Irlanda é INFESTADA de poloneses! A gente pode dizer que Gosia é polonesa, mas foi criada na Irlanda e lá vocês se conheceram. Vocês são amigos desde criança, que tal?
– Tudo bem. E você?
– Ah sei lá, fala que eu sou brasileiro e conheci todo mundo quando fui fazer um intercâmbio na Irlanda. Todo mundo vai fazer intercâmbio na Irlanda.
– Hum… Boa ideia. Vamos lá, vamos subir!

Ao infinito e além.

E lá fomos nós pro apartamento do maluco…

E onde vamos ficar em Munique?

Após várias risadas durante o caminho, enfim conseguimos chegar à Munique. O nosso amigo romeno, que era o dono do carro, estacionou em um subúrbio a mais ou menos uns 30 minutos de Munique e falou que iria ficar por lá. Gosia, eu e o alemão Negão, que se chamava Robin, tivemos que pegar um trem em direção ao centro, onde ficava localizado o flat do Robin. 
Pegamos o trem e, no caminho, eu e Gosia nos lembramos de algo: Er… onde iríamos dormir? Dentro do trem que nós fomos nos tocar que nos havia sido oferecido uma CARONA pra Munique e não UM COUCH pra poder ficar por lá. Ups, “Houston, we have a problem”. De boa, cara, era simples, o Robin era um couchsurfer, ele deveria estar pensando, instintivamente, que iria nos hospedar, bastava nós confirmarmos que ficaríamos no apê dele que tudo ficaria certo.
Quando estávamos pra descer do trem, fomos lá pra confirmar com Robin se ele iria nos hospedar (pô, doido, em momento ALGUM, O DIA INTEIRO, ele havia nos perguntado onde iríamos passar a noite). Qual a resposta? Ele na maior tranquilidade respondeu: “- Uai, vocês não procuraram um couch pra vocês ficarem aqui não?”.
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
DUUHHH!!
Jesus!!
– Não, Robin, a gente jurava que tu ias hospedar a gente!
– Pô, brother, no meu apê não dá pra ficar não! É uma quitinete minúscula e já tem um cara ficando por lá!!!
– Uai, mas o que a gente pode fazer agora?
– Ah, cara, sossegado! Lá em casa tem um pc com internet!! É só vocês conectarem na internet e ficarem pedindo couch pelo Couchsurfing.org que num instante vocês conseguem um lugar pra ficar.
Falando assim até parece simples, né? O problema é que o Couchsurfing.org é um site parecido com o Orkut. Você faz seu perfil e uma ou, no máximo, duas vezes por dia, vai checar se tem mensagem pra você pra assim responder os pedidos de couch. Só pra vocês terem uma ideia, eu quando viajava, começava a pedir couch com um antecedência de pelo menos uns cinco dias!! E só depois de uns dois ou três dias de “manda e-mail pra cá, recebe e-mail daqui, responde dali” que eu conseguia um lugar pra ficar! Quantas horas nós teríamos de antecedência pra pedir um couch?? Mermão, acho que umas duas no máximo! Já era umas seis da noite e do lado de fora tava um frio de lascar!! Albergue? No way, uma cama de albergue, da mais barata, custava 20 euros!! CADA UM!!! Depois da multa, agora não ter onde dormir. Essa carona REALMENTE estava nos saindo muito cara!

Outono em Munique

Beleza, ficar chorando é que não ia resolver nada. Chegamos ao apê do Robin, que realmente não tinha espaço pra colocar um colchão nem no banheiro, e começamos a mandar pedidos desesperadamente pro máximo de pessoas que podíamos!! Postamos na comunidade de Munique pedindo ajuda pra qualquer pessoa que fosse pra poder nos hospedar pelo menos por uma noite. Por meio de uma ferramenta do site, que você pode selecionar apenas os perfis que estão online (ou seja, as pessoas que naquele EXATO momento estão checando suas caixas de mensagens do Couchsurfing), nós começamos a mandar e-mails. E foram essas mesmas que nós começamos a, desesperadamente, mandar pedidos a torto e direito.
Nessas horas que eu penso que o Couchsurfing é um site abençoado, viu brother? Caraca, velho, mas não deu nem 15 minutos chegou uma mensagem no telefone da Gosia!! Um cara mandou uma mensagem pra gente dizendo que era pra nós irmos encontrá-lo numa estação de metrô particular, que em uma hora ele estaria lá nos esperando! Sério, fiquei impressionado!! Pô, nem albergue você consegue achar tão rápido numa cidade!! Fiquei impressionado como alguém pôde nos responder tão rápido!!!
Agradecemos ao Robin pela carona, pela internet e fomos pra estação de metrô pra poder nos encontrar com o figura. Vocês nem fazem noção da presepada que o cara era…
Qualé, mermão? Vai encarar?

Munique

Terceira maior cidade da Alemanha, Munique é a capital do Estado Federal da Baviera e possui uma população de aproximadamente 1,3 milhão de pessoas. O nome da cidade é derivada de “Monche”, uma palavra do alemão arcaico que significa literalmente “Monge”. A razão da nomeação da cidade com esse nome foi uma maneira de homenagear os monges Beneditinos que fundaram a cidade em 1158.
Foto do terrorista Afif Ahmed Hamid, uma das fotos mais famosas do “Massacre de Munique”
Munique foi duramente bombardeada durante a Segunda Guerra Mundial e teve praticamente metade de suas casas transformadas em pó durante o conflito. Apesar disso, hoje a cidade encontra-se inteiramente reconstruída e é uma das maiores cidades da Alemanha com uma economia pujante (Munique é sede de diversas empresas globais como BMW e Allianz).
Sede da BWM
Parque Olímpico de Munique
Embora possua uma rica história desde a sua fundação, Munique também foi palco de um dos mais trágicos acontecimentos na história esportiva. Em 1972, quando sediava os Jogos Olímpicos, terroristas de uma organização chamada “Setembro Negro” invadiram a Vila Olímpica e sequestraram atletas israelenses chamando a atenção do mundo inteiro para o conflito árabe-israelense. O sequestro teve um fim trágico com todos os reféns, parte dos terroristas e um oficial, sendo mortos em uma das piores e mais desastradas operações policiais já levadas a cabo na história. Quem quiser obter mais informações, favor clicar neste link

Mas, sem sombra de dúvidas, o que faz valer uma visita a Munique é a famosa Oktoberfest, que ocorreu uma semana após sairmos da cidade 😦

A caminho de Munique

Após quase uma manhã inteira, mais perdidos que surdo em bingo, enfim conseguimos pegar a nossa carona que, entre outros motivos, nos saía muito cara.
Os dois caras eram muito gente boa. Um era um alemão gigantesco e negão, filho de nigerianos, e o outro era um romeno, ambos moravam em Munique, eram do Couchsurfing e nos conhecemos em um meeting na República Tcheca.
Entramos no carro e fomos conversando. Uma chuva miserável caía do lado de fora. Nada de muito digno de nota rolou na viagem. Foi engraçado apenas cruzar mais uma fronteira da Europa (República Tcheca – Alemanha) sem nem perceber que estávamos saindo de um país pro outro. Outra coisa que foi MUITO engraçada foi uma história que surgiu no meio de um papo que a gente tava trocando lá. A gente tava conversando sobre mulheres (pra variar… Lembrar que a Gosia tava dentro do carro, antes que vocês pensem besteira) e o romeno nos contou uma história muito engraçada. Segue o diálogo com ele narrando (ou pelo menos a parte que eu lembro):
“…Rapaz, vocês falando de mulheres aí me lembraram de uma história meio estranha que ocorreu comigo. Eu tava um dia a noite com uns amigos em um Pub e dei uma saída pro banheiro. No caminho um brother meu me parou e disse que uma mulher o havia abordado falando que tinha me achando um gato. Achei que fosse sacanagem. Quando eu voltei pra mesa, tava todo mundo lá sentado e vi que tinha uma mina lá que eu não conhecia, percebi na hora que era a mina que meu amigo tinha me falado. Beleza, fiquei de boa e fui sentar. Quando eu sentei, do nada, todo mundo levantou da mesa, foi embora e me deixou sozinha com a mina. Ficou aquela situação meio estranha, mas de boa, fui trocar uma idéia com a mulher. Rapaz, a mulher não deixou eu falar nem duas palavras, já foi me agarrando pela nuca e me tascou um beijão. Enquanto ela beijava deu pra sentir aquele cheiro de cachaça, a mina tava mais bêbada que um gambá. Enquanto ela me agarrava, eu meio que dei uma empurrada nela e falei: – “Ow, pega leve aí!! Não é assim que é essas coisas não!! Funciona assim, óh: Você compra uma caneca de cerveja, a gente conversa, você manda uma cantada só e depois você me agarra pelo cangote, não é assim do nada não, meu!! Faz o seguinte, eu vou comprar uma cerveja pra você, daí a gente conversa e vê como fica nossa situação”. Tá, eu sou um cara meio fresco mesmo. Logicamente que não adiantou, eu trouxe uma caneca pra ela, a mina me agarrou de novo, não queria nem conversa, ainda piorou porque ela ficou mais bêbada ainda com a cerveja que eu trouxe. Vendo que não havia outra opção, fiquei lá com ela, já que meus amigos tinham ido embora. Depois de um tempo, deu vontade de ir pra casa e aí eu vi que estava com um problemaço, a mina havia me falado que todas as amigas dela já tinham ido embora e ela não tinha como voltar pra casa. Numa situação normal eu adoraria “ter um problema desses”, uma mina pra levar pra casa, mas pô, brother, a mina tava mais bêbada que um gambá, eu sabia que ia me dar trabalho quando chegasse em casa, vomitando ou algo assim. Enfim, eu “tive” que levá-la pra minha casa, não tinha outra escolha. Chegamos em casa e eu falei que ela podia ir dormir no sofá. Na hora que eu passei pela porta, a mina fechou a porta com as costas, me jogou na parede e começou a me agarrar loucamente. Putz, como fedia aquele bafo de cachaça dela, era realmente brochante. Eu meio que tentei me desfazer daquelas verdadeiras “ventosas” dela, mas a mina tava louca DEMAIS!! Depois de um tempo, ela deu uma “pernada dupla” em mim e me jogou no chão. Cara, eu não sei como ela fez aquilo, mas ela já tava pelada!!! O que eu fiz?
Tecla PAUSE

Galera, a partir daqui eu vou escrever em inglês. Um dos motivos é que eu acho que fica BEM mais engraçada essa história contada em inglês. Abaixo eu coloco a tradução em português

Tecla PLAY

So, what did I do? Dude, you know, really, I´m just a HUMAN BEING!! I couldn´t fight against her!! After some time of, you know, “love” she started to be really mad. She started to get my neck and pushed my neck and was shouting in my ears: “- Fuck me! FUCK ME, YOUR ASSHOLE!!”. Dude, she was crazy!! Really, man, it wasn´t sexy anymore, that words were simply pornographic!!

(O que eu fiz? Bem, cara, você sabe, eu sou apenas UM SER HUMANO!! Eu não pude lutar contra ela!! Depois de algum tempo de, você sabe, “amor”, ela começou a ficar realmente louca. Ela começou a agarrar o meu pescoço e puxar a minha cabeça enquanto gritava no meu ouvido: “ME COME!! ME COME, SEU CUZÃO!!”. Cara, sério, a mina era realmente louca!! Aquilo não era mais sexy, aquilo descambou foi pro ponográfico mesmo!!).
Munique, terra da Oktoberfest
 
No outro dia, quando ela acordou, ela me olhou com uma cara do tipo “Quem é você? Onde eu estou?” e não me restou outra opção a não ser levá-la pra casa. Além disso eu também tive que ficar quase um mês sem poder tirar a camisa e só andando de camisa de manga longa? Por quê? Velho, pra poder esconder as marcas das unhadas e mordidas que a mulher deixou em mim. Vou te dizer, é cada doido que você conhece por aí, viu?”
Não sei se ficou engraçado lendo, mas eu fiquei rindo MUITO enquanto lembrava e escrevia essa história. Hehehehehe… Enfim, depois de umas duas horas chegamos a Munique, onde tivemos uma bela surpresa…